Qual é o lojista que não quer saber quais produtos serão a bola da vez em um semestre marcado por incertezas políticas e econômicas, inflação e juros altos, além de eleições? Economistas e consultores especializados em varejo dão pistas. Um dos setores que mais sofreram com a covid-19, o de vestuário, deve ser o grande destaque de 2022.
O volume de vendas do setor deve crescer 9,6% neste semestre em relação a igual período do ano passado, de acordo com projeção da Confederação Nacional do Comércio (CNC). O varejo de roupas é o que mais deve crescer neste ano, 8,7%, em volume, na comparação com o ano passado, também para a equipe de economistas da MacroSector Consultores.
O IEMI – Inteligência de Mercado, consultoria especializada em moda e decoração, prevê alta de 6,9%, em peças, para o comércio de vestuário em 2022 sobre 2021. “Não há dúvida, o setor está se recuperando. Alguns lojistas já vendem até mais do que em 2019”, diz Marcelo Prado, diretor do IEMI, que monitora 2 mil varejistas de roupas no país.
Especializada em vestuário masculino, a Camisaria FMW, franqueadora com 30 lojas, é uma das redes que superam o volume de vendas anterior ao da pandemia do novo coronavírus. “O incremento é pequeno, mas ultrapassamos, em peças, os números de 2019, especialmente no mês de maio”, afirma Thiago Furquim, diretor comercial da Camisaria FMW. Este crescimento, de acordo com ele, é reflexo, principalmente, de demanda reprimida, em razão da pandemia, e do desaparecimento de marcas que não resistiram à crise.
Com 147 lojas, a Tip Top, especializada em roupas para bebês e crianças, também começa, neste ano, a vender mais peças do que em 2019. Maio também foi o melhor mês do ano para a rede, que comercializou, em volume, entre 15% e 20% mais do que em igual período de 2019. Junho também foi positivo, com alta de 4% a 5%, na comparação com junho de 2019. Julho já foi mais fraco do que igual mês de 2019, mas a rede prevê números melhores neste semestre.
“Estamos animados com o crescimento de vendas, mas com o pé no chão”, afirma David Bobrow, CEO da Tip Top, que deve terminar o ano com 20 lojas a mais do que em 2021. Bobrow diz que a rede também ‘colhe os frutos’ de ter modernizado lojas e logomarca e trocado toda a coleção durante a pandemia. “Quando voltamos, sentimos o efeito positivo.”
“O brasileiro sai do isolamento social e vai para o engajamento econômico, indo para o trabalho, para a escola, para as lojas”, diz Fabio Silveira, sócio-diretor da MacroSector. É um comportamento que, naturalmente, de acordo com Silveira, leva os consumidores a precisar mais de roupas e calçados.
Impacto pandêmico
O comércio de vestuário foi um dos que mais sofreram com a pandemia. 2020, certamente, é um ano que os comerciantes do setor querem riscar do calendário. Com as restrições de circulação de pessoas, o volume de vendas do comércio de vestuário e calçados caiu 22,5% em 2020 sobre 2019, de acordo com a PMC (Pesquisa Mensal do Comércio), do IBGE.
Em 2021, o setor se recuperou, cresceu 13,7% na comparação com 2020, mas ainda não atingiu níveis pré-pandêmicos. Considerando somente o mês de junho deste ano, o volume de vendas do setor é 4,7% menor do que o de fevereiro de 2020.
Foi a partir de março de 2020 que começaram as restrições de circulação de pessoas nas lojas de ruas, nos shoppings, e o fechamento do comércio no país. Comparando junho de 2022 com fevereiro de 2020, quedas maiores foram registradas pelo comércio de carros, de 5,7%, e de móveis e eletrodomésticos, de 14,2%, de acordo com a CNC.
Preços
“O setor de vestuário sofreu muito com a pandemia, mas uma hora o consumidor voltaria a comprar. Hoje, o problema é o preço no atacado”, diz Fabio Bentes, economista da CNC. A inflação no atacado do vestuário foi de 16,5% nos últimos 12 meses terminados em junho e, no varejo, de 11,9%. “Isto é, os lojistas estão repassando 72% da alta de custos. Se repassar 100%, as vendas desabam e, se não repassar, a margem cai. É como andar numa corda bamba”, diz Bentes.
Furquim, da FMW, diz que, de fato, repassa parte da alta de custos para os preços. “A inflação não é causada por alta da demanda, mas por falta de matéria-prima, produtos”, diz ele.
De olho nas vitrines
Pesquisas do IEMI revelam que os lojistas do setor de vestuário não apostaram na coleção de inverno deste ano, foram muito conservadores, e perderam a chance de faturar mais. A sugestão para os varejistas, diz Prado, é que aproveitem este momento, identificando as peças que são campeãs de vendas, preservando a faixa de preço dos produtos.
“Cada varejista tem seus preços alvos. Incorpore a esses produtos peças de maior valor agregado, para compor o mix, mantendo a qualidade melhor possível”, diz Prado. Geralmente, de acordo com ele, o produto mais caro é o que encanta o cliente, que o leva para dentro da loja. Por isso, o comerciante não pode deixar de investir nas vitrines.
O IEMI constatou que, entre 45% e 50% dos consumidores que param em frente de uma vitrine, gostam de um produto e perguntam o preço, acabam efetuando a compra. “As vitrines têm uma força enorme”, diz Prado.
Outros setores
De acordo com projeções da CNC, farmácias e perfumarias também terão desempenho positivo neste semestre, com alta de 6,6% sobre igual período de 2021. Outros setores que devem vender mais, em volume, na mesma base de comparação, são: combustíveis (13%), artigos de uso doméstico e eletrônicos (6,4%) e supermercados (0,3%). No caso de combustíveis, a reação está ligada à queda de preços. “Historicamente, sempre que o preço cai na casa de 10%, o consumo sobe 6,7%, em média”, diz Bentes.
O aumento na venda de eletrônicos já está relacionado com a Copa do Mundo, que acaba estimulando as vendas de televisores, especialmente. O varejo de móveis e eletrodomésticos e de material de construção já deve vender menos do que no segundo semestre do ano passado por conta dos juros altos, que encarecem o crédito. A CNC estima queda de 0,3% e de 0,9%, respectivamente, para esses dois setores.
O volume de vendas dos supermercados, que cresceu 0,4% no primeiro semestre deste ano sobre igual período de 2021, mantém este crescimento neste semestre, de acordo Bentes. A MacroSector prevê alta de 1% para o setor de supermercados neste ano sobre 2021. Para Bentes e Silveira, as vendas nos supermercados, que tiveram impulso com a pandemia, agora perdem fôlego em razão da alta de preços dos alimentos.