Há pouco mais de uma década, uma parceria entre o Simon Property Group, dos Estados Unidos, e a BRMalls, do Brasil, indicava que o mercado de outlets iria dar um salto no país.
Afinal, o negócio envolvia um grande investidor norte-americano e uma gigante brasileira do mercado de shopping centers para abrir pelo menos uma dúzia de empreendimentos.
O acordo não prosperou e um dos motivos, de acordo com executivos do setor, foi o atraso nas liberações ambientais para a execução de obra localizada na Rodovia Castello Branco.
Após várias crises econômicas e uma pandemia (novo coronavírus), especialistas em varejo e investidores afirmam que, desta vez, os outlets têm tudo para bombar nos próximos anos.
O Brasil tem hoje 19 outlets, o que o coloca como o principal mercado da América Latina, pois possui mais desses empreendimentos do que México, Colômbia, Chile e Equador juntos.
O Outlet Premium, localizado na Rodovia dos Bandeirantes, administrado pela General Shopping & Outlets, foi o primeiro empreendimento deste tipo aberto no país, em 2009.
Durante a pandemia foram abertos cinco outlets no Brasil e, até o final do ano que vem, pelo menos mais três empreendimentos deverão ser inaugurados.
O Pulse Outlet Mall, em Chapecó (SC), deve abrir em maio de 2024, o Olímpia Garden, em Olímpia (SP), em junho, e o Imigrantes Outlet Premium, em São Paulo, em novembro.
Boa parte dos que já existem vai aumentar de tamanho. Inaugurado em 2014, o Catarina Fashion Outlet, da JHSF, localizado na Rodovia Castello Branco, está em sua terceira expansão.
A área bruta locável deve crescer em 38 mil metros quadrados. A primeira fase da obra, de 23 mil metros quadrados, em construção, terá espaço também para serviços e entretenimento.
A General Shopping & Outlets, que opera a rede Outlet Premium, está expandindo todos os seus empreendimentos e construindo mais dois, em São Bernardo do Campo e Rio de Janeiro.
O Grupo Tacla Shopping abriu no final do ano passado o City Center Outlet Premium em Campo Largo, na região metropolitana de Curitiba (PR), o segundo outlet da empresa.
“Inauguramos o empreendimento com 95% de ocupação e já estamos com planos de expansão”, diz Maikon Bruno, superintendente do City Center, com 110 lojas e quiosques.
Com 74 mil metros quadrados de área construída, o City Center promete para os clientes produtos com descontos de até 70%.
Em quatro anos, a área bruta locável (ABL) dos outlets brasileiros deve crescer 50%, de acordo com Marcos Hirai, fundador do NDEV (Núcleo de Desenvolvimento de Expansões Varejistas).
O orçamento mais apertado e a vontade cada vez maior do consumidor de comprar boas marcas com preços acessíveis são alguns dos principais motivos da expansão dos outlets.
Os preços dos produtos nesses empreendimentos precisam ser, no mínimo, 30% menores do que os das lojas convencionais. O custo de operação dos lojistas também deve ser menor.
“Os outlets são resilientes na crise e chamam a atenção dos consumidores para a consciência de preços”, afirma André Costa, sócio fundador da Agência Brasileira de Outlets (About).
De acordo com ele, este mercado, que movimenta cerca de R$ 4 bilhões por ano no Brasil, tem crescido aproximadamente 20% ao ano nos últimos anos.
VENDA DIRETA DA INDÚSTRIA
Além do fator preço, os outlets têm sido impulsionados pelas indústrias e marcas que estão abraçando o modelo de venda direta ao consumidor (DTC, direct to consumer, em inglês).
A marca norte-americana Reebok, que já esteve no Brasil na década de 90, acaba de voltar ao país com uma loja no City Center Outlet Premium, com peças para modalidades esportivas.
Assim como a Reebok, marcas como Adidas, Nike, Levis, Cotton On, The North Face, MMartan, Tommy Hilfiger, Lacoste aderiram fortemente aos outlets.
“Algumas indústrias entendem que o outlet é um canal para vender sobras de franqueadas. O fato é que há muitas marcas produzindo somente para outlets”, diz Bruno.
Algumas marcas internacionais, de acordo com Bruno, querem estar em todos os outlets que abrem. Outras, como as de luxo, têm preocupação maior com posicionamento.
De um total de 800 marcas que estão espalhadas em shoppings tradicionais pelo país, segundo Bruno, pouco mais de 100 já estão também em outlets.
POTENCIAL DE EXPANSÃO
Para Luiz Alberto Marinho, sócio-diretor da Gouvêa Malls, o mercado de outlets ainda é incipiente no país, quando comparado com o dos EUA, e tem tudo para crescer.
“A cultura do outlet ainda não está disseminada entre os empresários brasileiros. As lojas ainda trabalham com sobras de coleção, o que trava o crescimento do setor.”
No exterior, diz ele, mais de 80% dos produtos vendidos em outlets já são produzidos para outlets, para não ter quebra, como falta de numeração e cores das peças.
Em sua avaliação, boa parte da indústria e do varejo no país ainda não vislumbra os outlets como canais para escoamento de produtos, o que também segura a expansão do setor.
Para Hirai, esse cenário dá sinais de que começa a mudar. Recentemente, ele recebeu a demanda de pelo menos quatro empresas interessadas em se instalar em outlets.
“Varejistas que querem crescer começam a considerar outlets, que também começam a fazer parte de estratégias de indústrias por ser um canal direto de escoamento de produtos”, diz.
Há mais de dez anos, na época em que foi feita a parceria entre a Simon e a BRMalls, um estudo de mercado chegou à conclusão de que caberia, na época, uns 30 outlets no país.
Muito provavelmente, de acordo com especialistas em varejo, o mesmo estudo nos dias de hoje pode chegar a um número muito maior do que 30.
“A indústria e o varejo precisam perceber a oportunidade que eles têm nos outlets”, afirma Marinho.
A pergunta que se faz muito hoje entre os empresários, de acordo com ele, é qual movimento deve vir primeiro para deslanchar esse mercado no Brasil. A abertura de novos outlets para que as marcas percebam que vale a pena ter lojas nesses locais ou as marcas começam a produzir mais para outlets e, a partir daí, eles expandem.
“Acredito que a os investidores em outlets, mais ousados, saem na frente, depois os lojistas vão ver que este é um bom canal de vendas. Me parece que hoje estamos diante deste desafio.”
O fato é que um não vive sem o outro, diz ele, e este modelo de negócio só expande para valer quando houver interesse de ambos os lados na operação.
Modelos híbridos de empreendimentos, isto é, aqueles que misturam outlets com shoppings convencionais, os chamados Mills, começam a crescer nos Estados Unidos.
Um exemplo é o Philadelphia Mills, localizado na Filadélfia (EUA), que pertence à Simon Property, a que tentou entrar no Brasil no passado.
Por aqui, de acordo com Marinho, quem tem um modelo mais parecido com este é o shopping Light, no centro de São Paulo, que mistura lojas com preços cheios e lojas de descontos.
Nos Estados Unidos, os outlets já são considerados atração turística. Além de reunir grandes marcas com preços mais acessíveis, os empreendimentos estão investindo em entretenimento.
“O próprio modelo já começa a evoluir de um simples local de compra, para um espaço de diversão.”
POSICIONAMENTO ABRASCE
Glauco Humai, presidente da Abrasce (Associação Brasileira de Shopping Center), diz que a chegada de um outlet traz inúmeros benefícios à região. “O setor de outlet vem crescendo ano a ano e se destaca por oferecer preços reduzidos o ano todo. Além disso, a chegada do empreendimento promove uma valorização imobiliária de 80% e um crescimento de 67% nos empregos.”
Ainda segundo a Abrasce, diferentemente do shopping tradicional onde a visitação é de passagem, o outlet é um centro de compras de destino, em que 80% do público vai com a intenção de comprar. “Ademais, sua abrangência, em regiões turísticas, atende a um raio de até 150 km”.
IMAGEM: Outlet Premium/divulgação
Texto publicado no Diário do Comércio de 20/04/2023