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O que os lojistas podem esperar para 2023

Se tem uma questão que aflige os empresários a menos de 20 dias da definição sobre quem será o novo presidente do Brasil é: o que vem por aí na economia?

Apesar da polarização em torno de dois candidatos, Luiz Inácio Lula da Silva e Jair Bolsonaro, três economistas ligados ao mundo do varejo não preveem catástrofe para o país em 2023.

Para três Fábios consultados pelo Diário do Comércio, Silveira, Bentes e Pina, o país não deve registrar taxas robustas de crescimento, mas tampouco passará perto de uma recessão.

Considerada o coração da economia, a taxa básica de juros, em 13,75% ao ano, muito provavelmente deve se manter elevada pelo menos no primeiro semestre do ano que vem.

O Boletim Focus, do Banco Central, projeta taxa de 11,25% para o fim de 2023.

Naturalmente, se o crédito é caro, famílias e empresários são desencorajados a comprar, a investir, situações que provocam um esfriamento da economia.

Para Silveira, o PIB (Produto Interno Bruto) do Brasil deve crescer 1,7% em 2023. Bentes prevê alta menor, entre 0,5% e 0,7%. Pina, mais otimista, projeta crescimento de 2%.

O fato é que, para eles, todos esses números, de 0,5% a 2%, estão bem abaixo de taxas que o país precisa para dar uma arrancada em sua economia.

Ao mesmo tempo, o mundo passa por uma crise, desencadeada pela pandemia do novo coronavírus e agravada pela guerra na Ucrânia.

“No exterior, principalmente na Europa, há uma dependência maior de energia elétrica da Rússia, com expectativa de alta de juros. Aqui, o ciclo de alta se completou”, diz Bentes.

“Felizmente, o Banco Central do Brasil é um agente independente, ainda que não formalmente, com bastante autonomia para tomar decisões”, diz Silveira.

“Apesar da polarização, as eleições transcorrem sem muitas aventuras. Há diferenças entre os governos, mas não se fala em fórmulas, como congelamento de preços e poupança”, diz Pina.

Com taxas de juros ainda elevadas, os setores de bens duráveis, como eletrodomésticos e móveis, deverão ser os mais atingidos em 2023, já que dependem de financiamento.

Menos dependentes de crédito, os setores de supermercados, farmácias e os serviços já devem ser favorecidos ao longo de 2023.

O importante, diz Pina, é o lojista não errar na dose. Se comprar demais, pode ter de arcar com os custos dos estoques. Se comprar pouco, pode perder oportunidade de vendas.

Daí a importância de acompanhar os cenários e cuidar da gestão dos negócios.

Veja abaixo as considerações dos três economistas para a economia em 2023.

FÁBIO SILVEIRA, sócio-diretor da MacroSector Consultores

2023 deve ser um ano de reacomodação do varejo, que deve crescer próximo de 2%, pois em boa parte do ano os juros continuarão elevados.

Mesmo que a inflação diminua no final deste ano e início do ano que vem, os juros devem continuar altos. Mas veremos alguma evolução da indústria, do varejo e dos serviços.

Neste ano, o setor de serviços deve crescer 8%, mas no ano que vem este número não deve ser maior do que 1%. Isso porque não há espaço para que este setor continue crescendo.

As condições macroeconômicas continuarão adversas com juros e desemprego ainda altos.

Fora isso, o Estado brasileiro vai ter de limitar gastos, que cresceram muito neste ano por conta das eleições. Em 2023, portanto, as contas públicas estarão desequilibradas.

Se o novo ou o velho presidente continuar gastando demais, aí sim vai ser uma tragédia. Se isso acontecer, a taxa de câmbio explode e o investidor estrangeiro foge do Brasil.

A Europa como um todo deve ter um crescimento equivalente ao do Brasil, mas por lá a estrutura de desemprego não é tão ruim quanto a do Brasil.

A estrutura de segurança previdenciária e social de lá é melhor do que a daqui. Lá não tem tanta gente fora do mercado de trabalho.

A massa real de salários deve crescer pouco no ano que vem e, muito provavelmente, não existirá mais o auxílio emergencial.

As contas públicas estarão desequilibradas e isso assusta o investidor. Quando acontece isso, o Estado é obrigado a emitir títulos para pegar dinheiro no mercado com taxas de juros altas.

Juros altos encarecem o crédito para as pessoas e para as empresas. Portanto, os fundamentos da economia não permitem pensar em crescimento acelerado em 2023.

Não é recessão, o país vai ter crescimento baixo, como nos últimos sete anos. O emprego que cresce continuará sendo de baixa qualidade.

A única forma de melhorar a distribuição de renda no país é apostar num processo de reindustrialização, redução de juros e carga tributária.

FÁBIO BENTES, economista da CNC (Confederação Nacional do Comércio)

2023 deve ser um ano difícil para a economia brasileira. A expectativa é de um crescimento entre 0,5%, 0,7%, ancorada na confiança de que o BC continue agindo para conter a inflação.

A missão é essa, trazer a inflação para dentro da meta, 3,5% hoje e 3,25% no ano que vem.

Inflação menor, caso se confirme, fará com que setores importantes se beneficiem, como os supermercados, os postos de combustíveis, já no primeiro semestre do ano que vem.

Como a taxa de juros para 2023 ainda estará alta, entre 11% e 11,5%, deve ser um ano ainda difícil para o setor de bens duráveis.

Até porque muitas famílias compraram muitos desses produtos durante a pandemia. Não deve ter tanto consumidor para estes produtos no próximo ano.

A taxa de juros deve cair somente na segunda metade de 2023.

Lá fora, o movimento de alta dos juros ainda não se completou, principalmente nos países dependentes de energia.

Aqui, o BC agiu rapidamente, e não há perspectiva de novo aumento de taxa no ano que vem. As incertezas no exterior estão maiores do que no Brasil.

Além de inflação e juros, há um outro condicionante para o desempenho da economia brasileira, o mercado de trabalho.

A expectativa é de uma taxa de desemprego média de 7,4% ao longo de 2023, menor do que a taxa média deste ano, de 9,5%.

Com menor inflação e desemprego, o comércio pode crescer mais no ano que vem do que neste.

O varejo pode crescer algo em torno de 2,5%, lembrando que, nos últimos três anos, cresceu 1,5% ao ano ou menos.

As condições de consumo e de massa de rendimento estarão mais favoráveis.

A massa real de salários deve crescer 3,9% no ano que vem e 3,7% neste ano. Não muda muito, mas o cenário é com inflação e desocupação menores.

Se o cenário é melhor para os setores de alimentos, medicamentos e combustíveis, já é mais desafiador para o setor de bens duráveis.

A taxa média de operações de crédito do BC é de 54% ao ano, a maior desde abril de 2018. Há espaço para queda no ano que vem, mas não muito.

FÁBIO PINA, economista da Fecomercio SP

O Brasil tem muitos problemas, mas está num grau de maturidade de discussão melhor do que já teve no passado. As eleições transcorrem sem muitas aventuras.

Claro que há diferenças entre governos, mas não se discute mais fórmulas, como congelamento de preços e poupança.

E, de certa forma, todos se comprometem com o controle da inflação, com uma política fiscal responsável.

Os discursos são diferentes, mas racionais, pois não está em discussão acabar com o arcabouço fiscal, confiscar poupança, não temos mais essa divisão.

2023 deve ser um ano difícil para qualquer um que presidir o país. Inflação e juros afetam as economias mundiais e brasileira.

Os juros elevados devem pressionar o câmbio. O BC não terá vida fácil, mas o banco acertou antes e vai receber um prêmio. O combate à inflação foi bem feito.

Quando muitos países devem sofrer pressão, o Brasil não vai precisar elevar os juros, pois já fez a lição de casa. O país deve registrar baixo crescimento, mas não recessão.

O Brasil está numa posição melhor para enfrentar um ano de déficit fiscal, pois não está quebrado.

O PIB deve crescer 2% no ano que vem, o que é bom em um ano com tantas turbulências. Agora, esse crescimento, claro, não considera uma guerra nuclear entre Rússia e Ucrânia.

O comércio em 2023 deve crescer de forma modesta em razão do endividamento das famílias. O emprego cresceu nos últimos anos, mas a renda cresceu pouco.

Com juros elevados, muito provavelmente as pessoas devem postergar as compras de bens duráveis.

As famílias, portanto, devem ter uma renda mais disponível para os bens não duráveis, como alimentos, e semiduráveis, como vestuário e calçados.

Neste momento, o importante é o lojista não errar na mão. O segredo não é crescer muito, mas ter claro o tamanho do crescimento, fazer uma boa leitura dos cenários.

No Estado de São Paulo, para este ano, a previsão para o comércio é de um crescimento real de faturamento entre 4% e 5% e, para 2023, entre 2% e 3%.

Publicado no Diário do Comércio 14/10/2022

 

 

IMAGEM: Thinkstock